La boîte à pensées – Minha voz de escritora

Eu escrevo para o Meia Palavra desde agosto de 2009. Tenho minhas incursões no mundo da ficção desde meus 12 anos, mais ou menos. E com o tempo percebi que eu mudo quando escrevo. Não sei como funciona a mente das pessoas normais, mas eu tenho uma personalidade escritora bem diferente do meu padrão de comportamento. É como ter uma voz da consciência de escritora.

Na vida real, sou um pouco desleixada com a aparência, pareço ser distraída, tranquila, muito calada ou faladora demais, dependendo do ambiente. Costumo usar uma linguagem mais técnica e seca no trabalho, e tagarelar até perder a voz com os amigos num bar. Sou daquelas tímidas que escondem a timidez num véu de familiaridade com meu interlocutor, ainda que desconhecido.

Mas o ato de sentar na frente de um computador e colocar minhas ideias no papel muda tudo. Minha fadinha escritora entra em ação e minha voz muda. Sou como que tomada por uma personalidade secretária eficiente e pomposa, com os cabelos num coque irretocável, saia lápis, óculos de gatinho e máquina de escrever. Minha postura automaticamente fica mais ereta e as palavras vão surgindo no papel (virtual) como se ditadas.

Ainda são as minhas ideias, organizadas de uma maneira que normalmente não consigo expressar falando. É a minha essência, de certa maneira, embrulhada na forma de uma tiazinha estenógrafa de tribunal. Ela corrige alguns dos meus vícios, formaliza meu discurso, me aproxima das minhas responsabilidades como escritora desse blog.

A coisa muda totalmente de figura se o tópico a ser escrito é ficção. Se vou falar de Victoria, Agatha, Kallisti, é a voz e a personalidade delas que tomam conta do teclado. Se são contos curtos, com personagens inominados, me sinto transportada para a cena em si e ela se descreve, de alguma maneira.

Talvez isso seja apenas a tradução imagética da minha concentração enquanto escritora. Talvez eu tenha um resquício de personalidades múltiplas, que só se manifestam na palavra escrita, com certeza fruto da minha vampira malkaviana de RPG. De toda forma é interessante ver a mágica enquanto as palavras se formam na tela.

Elas vão surgindo como se em sonho. Uma atrás da outra, palavras que formam ideias que eu não achava possível expressar. E por isso tenho muita dificuldade em revisar o que escrevo. E releio meus textos com um certo estranhamento, como se alterar algo tirasse o fantasma da minha voz de escritora do texto, como se eu editasse algo que não é completamente meu.

Sobre Clarisse

Uma menina com histórias pra contar...
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3 respostas para La boîte à pensées – Minha voz de escritora

  1. Palazo disse:

    Quiça todo bipolar, ou multipolar, é um escritor em potencial.

  2. Rubens "Ramalokion" disse:

    E eu que me achava um E.T.! Toda vez vou escrever algo, seja uma resenha ou um texto de ficção, eu me vejo (!) sentado em um bar/taverna contando a história para um interlocutor. A coisa fica louca mesmo porque esse interlocutor muda conforme o texto.

    Bom saber que não sou o único!

  3. Pingback: A trama do casamento (Jeffrey Eugenides)

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